quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Don't


Ao andar pela rua, sinto que não ando e que é a rua que anda à minha volta. É como se vivesse num tapete rolante, e houvessem fios enrolados à volta dos pulsos e dos tornozelos, fios controlados por alguém que, pobre coitado(a), não arranjou mais nada que fazer nesta vida chuvosa e aborrecida. E então, eu que pense que ando e que me movo, que vou rezar às igrejas que eu quero e que entro nos espaços que eu gosto, parando de vez em quando para chorar (porque, no fundo, sinto os fios a apertar, e simplesmente não me apetece acreditar que os há) num jardim que eu escolhi. Mas não escolhi nada - pensamento mórbido, para não dizer fatal -,é a camuflagem que me guia, sou camaleão para que alguém me queira em cima do seu ramo. Olhem para mim. Sou aquilo que quiserem, mato-me todos os dias e ninguém diria, ninguém diria.


Palavras que tantas vezes não abraçam aquilo que quero dizer, apressando-se a camuflá-lo com metáforas, perífrases, eufemismos ou silêncios, e a ideia, o sentir, o pensar, o querer, ficam cá dentro. Eu fico cá dentro. Porta fechada, do not disturb. Deprimido? Não, caro amigo, reprimido. Se eu for para onde quero, não vou por aí. Se eu disser o que penso, sou assassinado. Se eu me deixar levar, é o abismo que me leva e engole. Por isso, reprimido, sim, mas vivo e são, sem dever o que quer que seja a quem quer que seja, com a vida escrita numa lista de coisas-a-fazer, sem me fazer lutar nem pensar muito em coisas-que-não-são-para-fazer. E é isto. Reprimido, mas vivo. Cá estamos, não é verdade? Eu queria dizer mais, mas não me deixam porque já cansa.


Pedro Antunes

3 comentários:

Pseudónima disse...

Que bom saber que renasces todos os dias.

E, aqui entre nós que ninguém nos lê, Também te entendo, caro amigo de viagem. Boas palavrotas. ;)

Pedro disse...

:)

Kamon disse...

Criativo, como sempre.